Dorcelina Folador foi assassinada em outubro de 1999. Como Marielle Franco, ela não tinha 40 anos de idade; deixara duas meninas órfãs.

Todos os anos, as filhas, hoje crescidas, ocupam as mídias alternativas para lembrar a prematura e indignante morte da mãe. Repórter popular do MST, Dorcelina se filiara ao PT para se candidatar à prefeitura. Lá, da longínqua e abandonada Mundo Novo, na fronteira de Mato Grosso do Sul com o Paraguai, onde morava.

Havia tido paralisia infantil, por isso, puxava de uma das pernas. Na eleição de 1996, Dorcelina vencera os barões do tráfico e do contrabando que dominavam o pedaço. Ousara ser honesta: não roubara; não deixara que roubassem. Foi o bastante para encomendarem a sua morte.

O pistoleiro a matou com seis tiros – dos sete disparados, ele errou um. Com o impacto do primeiro projétil, o corpo de Dorcelina se movimentara: ela estava numa cadeira de balanço. Foi quando o pistoleiro, que era profissional mas não manjava de física, apertara o gatilho pela segunda vez: sua mira falhara.
Porém, igual aos seus mandantes, era bandido de raciocínio rápido: esperou o corpo se estabilizar, para, só então, efetuar mais cinco disparos. Dorcelina Folador morreu na varanda da sua casa.

No Rio de Janeiro, com a morte encomendada da vereadora do PSOL, Marielle Franco, qual negra ou jovem pobre, oriunda de favela, tentará um mandato popular, para ser porta-voz dos excluídos no parlamento ou no executivo? Não tentem, viu? Parece que esse recado já havia sido dado com o assassinato da prefeita de Mundo Novo.  E nós, homens combalidos e do tapinha nas costas, e, tampouco, as Marielles da vida não deram conta disso.

Fica a pergunta: que mulher íntegra e comprometida se atreverá, desde o assassinato da proba e aguerrida Dorcelina Folador, chegar ao poder naquela região sombria de Mato Grosso do Sul?

Por Luiz Taques. Escritor e jornalista, trabalhou na Folha de Londrina, entre outros veículos.

É autor de vários livros reportagens, contos e romances. Seu último livro, “Um Rio, Uma Guerra“, é de 2017, e foi publicado pela Editora Kan.

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